quarta-feira, março 05, 2008

Não te ponhas a pau que isso é anti-higiénico


Estava eu no aconchego do meu lar quando me batem à porta. Fui ver. Lá estava ele, alto, seco, aquilo que nas sábias palavras do povo se chama “um pau de virar tripas” mas mais magro. Já tinha ouvido nas notícias mas não queria acreditar e, no entanto, ali estava ele, um inspector da ASAD (Autoridade para a Saúde Alimentar e Doméstica), a entrar por minha casa dentro.

- Bom dia, vou começar pela cozinha!

Assim, sem preliminares nem “se faz favor”! E lá fomos nós para a cozinha. Entramos, ele olhou em redor.

- Hum! - disse ele.

- Hum? – perguntei eu.

- Hum. – respondeu-me ele, e sacou de um bloco e uma caneta e começou a gatafunhar com autoridade.

Ao fim duma eternidade, ou assim me pareceu, fechou o bloco e, do alto do seu poder (alto mas magro!), lança-me com aquela voz de “até podia tramar-te mas como sou um gajo porreiro…”.

- Tem aqui irregularidades suficientes para ficar com a cozinha interdita uma semana no mínimo! ... Talheres?

Eu, que ainda ruminava “cozinha interdita uma semana”, demorei a reagir.

- Talheres?! – repeti.

- Sim, gaveta dos talheres! – esclareceu ele como se estivesse a falar para uma criança.

Apontei-a. Ele abriu-a e repreendeu-me imediatamente.

- Não sabe que as facas não podem ter cabo de pau?

- Não podem?! – admirei-me.

- Claro que não! – respondeu ele como quem diz “dah!”, e continuou – Têm de ser de plástico e de cores diferenciadas para cada utilização específica.

E, enquanto fazia turismo pelas minhas gavetas, elucidava-me com evidente prazer.

- Sim, sim! Cabo vermelho para carne, cabo azul para peixe, cabo verde para legumes… verde escuro, porque verde claro é para fruta, claro!

Olhou para mim como se estivesse à espera de me ver rir de uma boa piada, retribui-lhe com um sorriso que mais parecia uma rosnadela e ele continuou:

- Faca com cabo amarelo para manteiga, com cabo violet…

Parou abruptamente, de falar e de se mexer, tinha chegado à gaveta das colheres de pau!

- Você… uuuchiiii… cco… ‘lheres de pau!!??

Foi o princípio do fim! A inspecção ao resto da casa somou mais duas violações do código sanitário, uma do código dispensário e três do código balneário। Resultado: dois meses a viver no meu carro até a minha casa reunir as “condições de habitabilidade” exigidas pela ASAD.